A Póstuma Vingança de Norma...
..e Um Brinde à Família
por Daniel Pepe
Insensato Coração chegou
ao fim com um dos desfechos mais surpreendentes dos últimos tempos. Nem tanto
pela assassina de Norma ter sido a Wanda, mas por Norma, mesmo depois de morta,
ser a mandante da morte de Léo. Que ele morreria na cadeia a mando de Cortez,
poderia ser pensado, mas jamais que Norma seria a responsável, através de
Jandira, por revelar ao ex-banqueiro que foi Léo quem entregou para a polícia o
vídeo que o incriminava. A morte de Norma a três capítulos do final nos jogou
um balde de água fria, já que era mais interessante acompanhar a trajetória
dela do que a de Leo. Mas uma simples cena, revelando a conversa entre ela e
Jandira, foi suficiente para nos devolver a torcida e nos sentirmos vingados
por Norma. Palmas para os realizadores, que nos tiraram do marasmo de finais
esperados, sem grandes surpresas que aconteceram nos últimos anos. Simples
detalhes como esses podem mudar drasticamente a escala de avaliação de uma novela
entre péssima e ótima.
Mas a novela foi bem
mais do que isso, claro, e os outros 184 capítulos pesam decisivamente na
avaliação da obra. Muito se falou dos pontos positivos e negativos, assim como
da trajetória de Norma, que entra para a galeria das melhores personagens da
carreira de Glória Pires. Conhecemos a enfermeira já caindo de amores por Leo,
deixando a emoção tomar conta de suas atitudes. Depois de enganada e condenada
injustamente, o lado racional entra em ação e a heroína-vilã arquiteta os mais
elaborados planos para ter elementos que coloquem Leo sob seu controle. E
quando isso acontece, volta novamente o lado emocional que a faz se deixar
seduzir novamente pelo seu algoz, mas sem que com isso ela se torne a mesma
parva da primeira vez.
Retomando o título da postagem, partirei de
um comentário que o autor-porta-voz da novela, Ricardo
Linhares, disse algumas vezes: que Insensato Coração é um melodrama familiar,
que trata das relações familiares. Juntamente com o discurso final – já batido
em finais de novelas - da matriarca Vitória Drummond, onde ela faz um brinde à
família, que muda de feições, mas cujas bases sempre continuam as mesmas, agora
seria um bom momento para analisar essas afirmações.
A família Brandão aparentemente tinha tudo
para não ter problemas. De classe média alta de Florianópolis, tendo superado
fortes crises financeiras, mostrou fragilidade e má formação de caráter na mãe,
Wanda, e no filho mais velho, Leo. Desde o princípio fomos apresentados a ele
como sendo responsável por golpes e armações com o objetivo de enriquecer
facilmente. Não bastasse isso, demonstrou que sempre teve ciúmes e inveja do
irmão, não perdendo nenhuma chance de prejudicá-lo. No caso de Wanda, notamos
sua fragilidade ao apoiar incondicionalmente o filho. Mas o que mais marcou até
o capítulo final foi a traição ao marido com o cunhado, desestabilizando de vez
o casamento. Com o passar do tempo, cada vez mais o ex-casal se distanciava dos
mesmos princípios e atitudes, não restando nenhuma chance de volta, para, no
final, nem mais amizade restar. A revelação de Wanda ser a assassina de Norma
completou o que faltava para a personagem não ter nenhuma chance mais de se
redimir.
Do outro lado, tivemos Pedro e Raul. O
primeiro nunca demonstrou grandes preocupações com as bases familiares. Já o
pai, sempre procurou ajudar os filhos e a ex-mulher. Sobretudo conseguiu passar
o mesmo afeto aos dois, sem com isso fechar os olhos para os crimes de Leo.
Sendo o maior merecedor de uma família bem construída, pôde ter a chance de
fazer uma nova ao lado de Carol.
Ainda em Floripa, fomos
apresentados também aos Machado, que se uniriam aos Brandão, caso tivesse
vingado o casamento de Pedro e Luciana (Fernanda Machado). A avó, Zuleica, o
pai, Júlio, e as filhas, Leila e Cecília, sempre tiveram boa índole, a despeito
de alguns defeitos. Já a mãe, Eunice, e sua irmã, Luciana, preocupavam-se mais
com as aparências do que com os verdadeiros sentimentos. Com a morte de
Luciana, foi em Eunice que pudemos observar a constante obstinação em passar a
falsa imagem para a sociedade. Sempre preocupada em arranjar bons casamentos e
oportunidades para as filhas (leia-se: dinheiro), não mediu esforços em fazer
armações para que os próprios objetivos fossem cumpridos em detrimento das
vontades das meninas. Tudo muito claro aos olhos de todos, que de uma forma ou
de outra, conseguiram tolerar isso. A história mudou quando Eunice passou a ter
um caso com Ismael, o capanga de Norma. A hipocrisia tornou-se mais clara
ainda, sendo a gota d’água para o assolamento da família, quando o caso veio à
tona. A reconstrução deu-se a partir do momento em que Júlio encontrou um novo
amor. Sobrou para Eunice a má reputação de mulher separada por ter sido
adúltera. E ficou claro que, mesmo recomeçando de baixo, continuará com o mesmo
caráter.
Já no Rio de Janeiro,
tivemos a família Cortez, formada pelo banqueiro Horácio, a mulher, Clarice , o
filho do casal, Rafa, e a filha de Horácio, Paula. Nela os desvios foram tão
sérios quanto na família Brandão. A corrupção e ganância de Horácio culminaram
com a morte da esposa. Paula não saiu muito diferente ao pai, apoiando e
fazendo vistas grossas às suas maracutaias. Além de toda a futilidade e
mesquinhez que permearam todas suas atitudes. Ficou então a cargo de Rafa fazer
justiça à memória da mãe, tendo ele sempre demonstrado bons princípios e a
obstinação em estudar para combater a impunidade.
A trajetória das famílias fica simbolizada
na estátua da abertura. Mas serviu apenas como pano de fundo à vingança de
Norma, aos golpes de Leo e às tramas paralelas. Não serviu como mote principal
da história, mas como algo para ser levado em conta.
Se todas as famílias fossem como nos
porta-retratos...
11 comentários:
Eu fico impressionado como esse Engenheiro escreve tão bem! Parabéns Daniel os seus textos são imbatíveis!
Concordo com tudo! Gostei muito do final. Óbvio sim. Mas pelo menos fugiu do trivial.
Abs
Gostei de Insensato Coração. Gosto da novela desde o 1º capítulo, nunca duvidei da trama. Lembro que li muuuuitos comentários de leitores em diversos sites condenando a novela lá no inicio. Gosto dos dramas, das novelas que falam das relações familiares e esse tema foi muitíssimo bem representado na figura do Raul que passou muita honestidade. Antônio Fagundes fez a diferença.
Pepe um dos amigos da blogueesfera mais recíprocos que há... acho o máximo essa interação e em concordância ao Fábio também o parabenizo!
Só repito nos comentários o que já disse em outros posts sobre Insensato Coração, não curti essa novela, não me deixa saudade, mas houve sim, pontos positivos e merecem ser reverenciados!
Insensato Coração teve seus méritos, foi uma trama bem amarrada. Glória Pires foi decisiva para o interesse do público.
Lucas - www.portalcascudeando.blog.com
Excelente análise da novela, sob a ótica de sua teia de relações familiares. Entre altos e baixos, é inegável a repercussâo de Insensato Coração, sobretudo quanto à audiencia, freando a linha decrescente que há anos assolava o horário nobre.
Obrigado por explicar a abertura kkkkkkk
Mas falando sério, Insensato Coração não vai deixar saudades, realmente, mas não se pode perder o otimismo. A trajetória de Norma, protagonista da parte inovadora da trama, foi mais interessante, mais difícil e mais revoltante. Já a parte melodramática e maniqueísta, do triângulo Léo-Marina-Pedro, de mais fácil digestão, recebeu mais atenção dos autores na primeira metade da trama e nos momentos finais também. Sonhei em ver Norma rica e vingada, triunfante e um pouco má (!) na última cena, e não um beijo entre Marina e Pedro!
Eu falei que não se pode perder o otimismo porque Insensato Coração foi uma novela planejada e, independentemente de serem boas coisas planejadas ou não, isso é um mérito. Comparada a Passione, que flutuava ao sabor da audiência com personagens mal definidos, ganha.
Uma última nota: o tema da homofobia merece todo aplauso. Entra para a lista de novelas que efetivamente prestaram um serviço ao Brasil no que tange ao tema, juntando-se com Tititi (2010) e A Próxima Vítima (1995).
Achei que "Insensato Coração" seguiu a mesma linha trágica de "Passione": foi uma das novelas mais depressivas dos últimos tempos. O último capítulo coroou isso e foi muito deprimente. Não entendo como alguém consegue assistir a uma novela que mostra mais desgraças do que coisas positivas. A maioria dos personagens não tinha caráter e só pensava em levar vantagens sacaneando os outros.
"Fina Estampa", pelas chamadas, parece que será mais solar, mais pra cima. Vai mostrar personagens mais batalhadores e eu acho que é disso que sinto falta no horário nobre. Chega de novelas pesadas!
Realmente, a cena foi peça-chave do final da novela. Muito bom! Aliás, Insensato Coração tem dois méritos: um final decente, com desfechos convincentes e sem deixar nada "em aberto" (acho finais "em aberto" um desrespeito ao público); e uma trama muito bem armada, pois todas as ações, até aquelas lá do início que ninguém se lembrava mais, foram elementares em algum momento da história. Pena que a primeira fase tenha sido tão cansativa, senão Insensato figuraria entre as melhores novelas da Globo. Mas Norma foi uma grande personagem, e a novela foi digna. Abraço!
André San - www.tele-visao.zip.net
Eu gostaria que o Leo tivesse sido o assassinmo da Norma, e a Wanda tivesse se acusado para proteger o filho. Acho que ficaria mais emocionante.
Insensato passou como uma nuvem cinza: uma novela pesada, sem grandes atuações e sem surpresas.
E que atuação maravilhosa de Glória Pires, hein?
Não amei "Insensato Coração". Preferi "Paraíso Tropical" e "Celebridade", mas enfim... A novela deu o seu recado e Gilberto Braga continua sendo um dos meus autores preferidos. Só fico indignado com uma coisa: o público não se choca nadinha com as safadezas de Natalie, que vai pra cama com outro homem só porque o marido não quis levá-la à festa. Mas com um relacionamento gay saudável, a "família brasileira" manda recado à Globo para que silencie o romance! Quanta hipocrisia!
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