III Obitel (Observatório Ibero-Americano de Ficção Televisiva)
por Daniel Pepe
Nos últimos 21 e 22 de novembro foi sediado em São Paulo o III Obitel, evento que envolve pesquisadores e estudiosos universitários nacionais e internacionais de onze países, tendo como coordenadora, aqui no Brasil, a Profa. Dra. Maria Immacolata Vassallo de Lopes (ECA-USP). O objetivo do encontro, que ocorre em intervalos de até dois anos, é apresentar estudos de ficção seriada em geral, tratados de forma acadêmica. A análise das produções televisivas apreciada sob a ótica de conceitos científicos merece atenção e dedicação tanto quanto a análise de outras áreas do conhecimento humano, por proporcionar, entre outras coisas, o estudo de comportamento dos telespectadores em determinada época e sua evolução no tempo.
O tema deste encontro foi “Ficção Televisiva Transmidiática no Brasil: plataformas, convergências, comunidades virtuais”, promovido pelo Globo Universidade e pela Universidade de São Paulo. Foram dois dias onde oito equipes compostas cada uma por pesquisadores seniores, seus mestrandos, doutorandos e bolsistas de iniciação científica apresentaram seus trabalhos realizados num período específico que permitisse o estudo detalhado de cada caso.
Ao centro, a Profa. Maria Immacolata |
Em seguida, Mario Carlón (Universidad de Buenos Aires) comparou as telenovelas com as séries americanas. Nas primeiras nota-se a predominância de temas clássicos, tais como: amor/desamor, relações familiares, vingança, traição, dramas de identidade, etc.; enquanto que nas séries, sobretudo na última década, narrativas mais complexas foram experimentadas em séries como Lost, Medium, Six Feet Under, Medium, Os Sopranos, etc. Arlindo Machado (USP/PUC-SP) complementou a palestra de Carlón discorrendo sobre a atuação dos telespectadores na série Lost que, a rigor, não deveria ser somente assistida pela televisão, mas explorada em outros meios, sobretudo na internet em sites com conteúdo exclusivo, comunidades e blogs com discussões sobre o que passou na TV, mas que, devido às suas limitações, não pôde ser apreciado da forma correta, compondo assim a narrativa transmidiática.
Abrindo o ciclo dos temas abordados pelas equipes de várias universidades do país, Anna Maria Balogh (UNIP-SP) coordenou o trabalho “As Astúcias da Linguagem na Narrativa Seriada”. A professora discorreu sobre as séries Som & Fúria (2009) e Na Forma da Lei (2010). Esta última apresentou intertextualidade com várias séries similares americanas, tais como Law and Order, CSI e NCIS, assim como referências a filmes noir. Geraldo Nascimento apresentou análises sobre Maysa – Quando Fala o Coração (2009), minissérie que convidava o telespectador a penetrar no mundo de Maysa a partir da própria abertura, que mostrava objetos pessoais da cantora. Também falou sobre Dalva e Herivelto (2010) e as plataformas com as quais interagia: o livro, o rádio e o universo fonográfico. Solange Wajnman analisou a série Aline e como o público interagia através de blogs, apresentando suas percepções referentes às histórias.
A segunda mesa foi coordenada por Maria Cristina Brandão (UFJF) com o tema “Vim Ver Artista e Pegassione: A Paródia em Plataforma Autorreferencial”. Como o próprio título sugere, foi apresentado um trabalho sobre as paródias das novelas Viver a Vida (2009) e Passione (2010) feitas no humorístico Casseta & Planeta. De acordo com a professora, os quadros são produtos autorreferenciais em que a televisão oferece um painel paródico dela mesma. A equipe citou o humorístico TV Pirata, o pioneiro em realizar paródias sobre as novelas que estão no ar, e ainda comparou os sites reais das novelas com o as paródias feitas no site do Casseta & Planeta.
Os debates de terça-feira iniciaram-se com a equipe da UFRGS, liderada por Nilda Jacks, mostrando a interação do público com a telenovela Passione, baseado em dados levantados em revistas mensais e semanais, jornais de maior circulação, TV e internet (Orkut, Facebook, Twitter e blogs). Alguns resultados interessantes apresentados foram: os personagens Clara e Totó foram os únicos que estiveram em evidência em todos os veículos estudados. Já as revistas femininas focaram nas mulheres, sobretudo Clô, Stela, Jéssica e Agostina. No Orkut pôde-se constatar, nesta ordem, que Clara, Fred e Diana foram os personagens mais amados pelos usuários da rede. Mesmo assim, Diana foi a mais odiada. De uma forma geral, os temas mais recorrentes em todos os veículos foram o suspense criado pelo autor da novela em torno de uma morte por volta do capítulo 100 (que ocorreu mais tarde), o segredo de Gérson e a relação bígama de Berillo com Jéssica e Agostina.
A equipe da USP, de Maria Immacolata Vassallo de Lopes, abordou as temáticas sociais de Passione nas comunidades virtuais de fãs: Orkut, Facebook e Youtube. Foi observado nessas redes grandes discussões e engajamento que ultrapassaram os limites da novela em torno dos vários temas sociais, tais como: pedofilia, exploração sexual de menores, gravidez na adolescência, exploração do trabalho infantil, casamento consangüíneo e uso de drogas. De acordo com a pesquisa, Passione foi mais amada do que odiada nas redes sociais. No Youtube pôde-se observar a criação de conteúdo próprio, como os vídeos parodiando o segredo de Gerson; um grande exemplo da interação do público com a novela: ele não é mais um telespectador “passivo”.
Maria Aparecida Baccega (ESPM-SP) e equipe analisaram a forma como foi consumida a novela Viver a Vida, através da Globomarcas.com e do blog “Sonhos de Luciana”. O telespectador interagiu com a novela através do site, procurando acessórios usados pelos personagens, tais como: sandálias, pingentes, anéis, bolsas, brincos e canecas. O site sugeria, inclusive, a forma de usar os produtos. No blog “Sonhos de Luciana” houve um fenômeno que ultrapassou as barreiras da ficção: os leitores interagiam como se Luciana fosse uma personagem real.
Elizabeth Bastos Duarte e Maria Lília Dias de Castro (UFSM) debateram sobre os movimentos de convergência entre diferentes mídias e plataformas na ficção seriada gaúcha, produzida pelo Núcleo de Especiais da RBS TV. O primeiro seriado analisado foi As Aventuras da Família Brasil, decorrente da transformação de uma tira de jornal de Luís Fernando Veríssimo. Em seguida, a série Quatro Destinos exemplificou a presença de outras plataformas presentes no texto do programa: a comunicação via telefone celular - utilizada com frequência - e técnicas computacionais – observadas na edição das imagens. Finalmente, Online foi uma série cujo tema era o interesse geral pela Internet, com troca de e-mails, conversas por MSN e buscas no Google.
A PUC-SP, comandada por Sílvia Helena Simões Borelli, apresentou o trabalho de sua equipe sobre as migrações narrativas em multiplataformas nas novelas Ti Ti Ti (2010) e Passione. A partir de Passione, pôde-se observar uma transformação nos sites de novelas, que antes eram calcados, sobretudo, em textos e imagens, e agora têm os vídeos ocupando um espaço expressivo. Passione inovou também em inserir conteúdo exclusivo para a Internet, monólogos reflexivos dos personagens que só poderiam ser vistos na rede. Ti Ti Ti também adotou a mesma ideia, indo mais além. As revistas fictícias presentes na novela tinham sites e blogs que mesclavam personagens e eventos reais com os da telenovela.
Finalizando as mesas, Yvana Fechine (UFPE) e Alexandre Figueirôa (UNICAP) apresentaram os temas multiplicação das telas, maior autonomia do público e expansões narrativas. Fechine abordou a produção e distribuição de conteúdos televisivos e a questão de certas tecnologias serem mais adequadas a determinados gêneros televisivos. Apontou ainda as diferenças entre a TV Conectada – que propõe a disponibilização de conteúdos na internet na televisão – e a TV Transmídia – disponibilização de conteúdo televisivo em outras plataformas.
Daniela Pereira |
***
Fotos: Globo Universidade
Fotos: Globo Universidade
Imagens: Divulgação
3 comentários:
Pena que não pude ir. Quem foi falou que tava muito interessante. Novas tendências. É o tão falado futuro da telenovela que se faz presente.
Bjs
Adorei!!! Sem dúvida, a teledramaturgia brasileira pode ser vista e estudada de diversos aspectos. Ótimo encontrar aqui no blog informações sobre debate.
Lucas - www.cascudeando.zip.net
É interessante como os sites de novelas mudaram e hoje a parte dos vídeos estao bem mais em evidência devido ao grande número de pessoas que assistem as novelas na internet.
Tem a novela inteira ou a opção de se ver cena por cena.
Abraço
Postar um comentário