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terça-feira, 23 de outubro de 2012











Glória Guerreira
Salve Jorge traz o que sua autora tem de melhor

por Duh Secco


Qualquer autor tremeria na base diante da responsabilidade de substituir um sucesso como fora Avenida Brasil, fenômeno de crítica, audiência e repercussão. Entretanto, Glória Perez não deixou transparecer nenhum resquício de insegurança ao assumir tal tarefa, ontem, na estreia de Salve Jorge, seu novo trabalho. Unindo realidade e fé, a autora soube dar o pontapé inicial, causando no público impacto semelhante ao causado pelas primeiras emoções da novela antecessora no horário.


A tarefa de Glória é ainda mais ingrata por conta dos comentários do público acerca de seu estilo. Todo noveleiro age como crítico de TV, em conversas com vizinhos ou em uma mesa de bar. Com o advento das mídias sociais, entretanto, as opiniões expressas pelos telespectadores ganharam uma dimensão muito maior, a ponto de definir o sucesso ou não de uma novela, independente da audiência registrada pelo Ibope. Foi assim que Avenida Brasil ganhou tamanha dimensão ao longo de sua exibição. A novela substituía Fina Estampa, trama de Aguinaldo Silva (outro autor que sempre é, previamente, criticado pela comunidade noveleira), que apesar dos bons números foi massacrada pela opinião pública. Assim, João Emanuel Carneiro e Ricardo Waddington, amparados pelo bom trabalho que desenvolveram, fizeram de Avenida Brasil a salvadora da pátria para uma nação interessada em uma novela das 21h com cara de novela das 21h. Glória Perez assume o horário com uma situação inversa: qualquer coisa que possa apresentar em Salve Jorge vai parecer, a princípio, pequena diante da grandiosidade do trabalho anterior.

O fato de a atual novela ter parte de sua trama desenvolvida na Turquia já colabora para que os críticos de plantão, os profissionais ou não, encontrem motivos para criticar o trabalho da autora. O mesmo se reflete no núcleo pobre, desta vez localizado no Complexo do Alemão; e na repetição de tipos, como Diva, personagem de Neuza Borges. A ambientação dada por Glória à praticamente todos os seus trabalhos faz com que eles pareçam previsíveis aos olhos dos telespectadores (e eu me incluo entre estes). Ao que parece, porém, esse não é o caso de Salve Jorge.

Glória prendeu a atenção do público logo nos primeiros minutos da novela, ao abordar a pacificação no Complexo do Alemão, reproduzida na cidade cenográfica e engrandecida por imagens reais. Vimos que a protagonista, Morena (bem defendida por Nanda Costa), padeceu com o conflito instalado entre os traficantes que dominavam a comunidade e a força policial. Além de conviver com a violência na porta de sua casa, Morena precisa se virar para, com o auxílio da mãe, Lucimar (Dira Paes), sustentar o filho que tivera com um traficante, aos 14 anos. A vida difícil que leva, humaniza Morena e pode fazer com que o público não passe a rejeitá-la, quando ela deixar o filho e seu grande amor, Théo (Rodrigo Lombardi), para trás, ao decidir tentar a vida no exterior, sendo aliciada por Lívia (Cláudia Raia), responsável pelo tráfico humano que irá prejudicar diversas personagens ao longo da narrativa. Com esta humanização de Morena, Glória Perez evita cometer o mesmo erro de América, exibida em 2005. Nesta trama, Sol (Deborah Secco) almejava enriquecer nos Estados Unidos, fazendo deste o seu único objetivo na vida. Algo maior do que o amor que sentia pelo peão de rodeio, Tião (Murilo Benício). O resultado da construção errônea no perfil de Sol levou América a uma crise de audiência e a completa desestruturação do casal protagonista, tanto que, no final, Tião e Sol terminaram com outros amores, Simone (Gabriela Duarte) e Ed (Caco Ciocler), respectivamente.


Apesar da dura rotina a qual é submetida, Morena encontra tempo para se divertir nos bailes funk de sua comunidade, o que faz dela uma figura com grande apelo popular. Assim como as irmãs interesseiras Aída (Natália do Vale) e Raquel (Ana Beatriz Nogueira), que prometem disputar a herança de Leonor (Nicette Bruno), e Lurdinha (Bruna Marquezine), uma piriguete que difere de Suelen (Ísis Valverde), moça que ocupava tal posto na novela anterior. O comportamento e as ambições se assemelham, mas Lurdinha não tem tanta noção do perigo quanto Suelen, já que, para conseguir uma vida melhor, não hesita em dar trela aos homens do tráfico do Alemão. É na comunidade que encontramos também dona Lucimar, a mãe de Morena, que também pode ganhar grande empatia por parte do público. É uma mulher devotada às suas raízes, que convive com gente da alta sociedade, que a ludibria sem a menor culpa. Caso de Stênio (Alexandre Nero), que para impedir que os moradores do Alemão delatassem o seu genro Pepeu (Ivan Mendes), tomou para si a responsabilidade pelos cuidados médicos aos quais o senhor que havia sido atropelado pelo jovem precisaria ser submetido. Pepeu é noivo de Drica (Mariana Rios, que ainda apresenta resquícios de Yasmin, sua personagem em Malhação), a irresponsável filha da delegada Helô (Giovanna Antonelli), outra personagem que pode conquistar os telespectadores. Profissional irrepreensível e defensora da lei, a delegada é uma compradora compulsiva e acumula sacolas e mais sacolas em seus armários.


A lei, inclusive, está presente em diversos núcleos de Salve Jorge. Além da delegada Helô e de seu ex-marido advogado Stênio, temos os membros da cavalaria armada das forças do Exército. É lá que encontramos Théo, o protagonista, verdadeiro herói romântico que, em um primeiro momento, não parece afeito a compromissos. Isto até conhecer Morena, com quem cruzou ao final do primeiro bloco e no término do capítulo, quando, em um momento de distração dela, seu filho Júnior (Luís Felipe Melo), correu em direção aos militares, assustando o cavalo de Théo, homem devotado à sua fé em São Jorge.


A temática da fé, aliás, contribuiu para que fanáticos religiosos tentassem promover um boicote à novela, alegando que o título da mesma faz referência a entidades espíritas. Independente do uso da expressão ou não, é de se lamentar que pessoas que pregam a fé sejam tão cegas e arregradas aos ensinamentos de suas religiões, a ponto de incitarem uma revolta contra um produto que, até o momento, não se mostrou afeito a doutrina alguma. É uma falta de respeito tamanha que chega a colocar em descrença os reais motivos pelos quais as pessoas buscam uma religião. A Record, que não faz mais questão de esconder sua ligação à Igreja Universal do Reino de Deus: promoveu a estreia da reprise de Rei Davi na mesma data em que Salve Jorge estreou, proferindo nas chamadas da minissérie, frases como “Você escolhe o que é certo e o que é errado”, como se pregasse que apenas os fiéis da igreja de Edir Macedo fossem dignos de respeito. E audiência.


Glória Perez passou por cima de todos esses comentários, assim como fez em América, quando grupos defensores dos animais a ameaçaram de morte por conta da abordagem do mundo dos rodeios. Sua sensibilidade para perceber temas relevantes, como os que fizeram de Barriga de Aluguel e O Clone, grandes sucessos de audiência, a credencia como uma das grandes autoras do Brasil. A dose de fantasia em que em envolve seus roteiros faz com que muitos a critiquem, tal e qual faziam com Janete Clair, também perseguida pela crítica; naquele tempo, restrita aos jornais e falatório nas ruas. E a atualidade se faz pungente em suas obras, como nas situações em que Sidney (Mussunzinho) divulga detalhes da pacificação do Alemão pela internet ou como quando Demir (Tiago Abravanel) simula passos de “Ai, Se Eu Te Pego", hit de Michel Teló, para turistas brasileiros. Assim, Glória fez de Salve Jorge uma boa estreia, conduzida por uma boa dose de ligação com a realidade, personagens de fácil assimilação e pela direção eficaz de Marcos Schechtman. Que venha o sucesso!


4 comentários:

Rodrigo disse...

Estou gostando de "Salve Jorge". Novela forte, carismática, consegue prender a minha atenção. Finalmente, Glória Perez acertou na escolha do casal protagonista, item que desde "O Clone" ela estava nos devendo.

Eu já sabia do talento da Nanda Costa e ela está sabendo aproveitar muito bem a oportunidade que lhe foi dada. Morena é o típico caso de papel escrito sob encomenda e promete entrar pra galeria das mocinhas marcantes da teledramaturgia brasileira.

Rodrigo Lombardi é um grande ator mesmo. Ele consegue fazer o público pensar que ele é um galã, e só um grande ator consegue esse feito. Me faz lembrar José Mayer, outro ator feio que todos pensam que é galã.

Porém, devo confessar que nunca achei graça nas vilãs criadas por Glória Perez. Coincidência ou não, o fato é que nenhuma delas marcou história na teledramaturgia. Acredito que o texto que a autora escreve para suas antagonistas não ajuda, pois é trivial demais, sem nenhum traço de criatividade. Isso faz com que elas não fiquem tão marcadas pelo público quanto as vilãs de Aguinaldo Silva, Gilberto Braga, Silvio de Abreu, e agora, João Emanuel Carneiro.

E pra piorar, Cláudia Raia, na minha opinião, ainda não encontrou o tom de sua vilã Lívia. Por enquanto, nada em termos de interpretação diferencia a personagem da Angela Vidal de "Torre de Babel" e da Ágatha de "Sete Pecados". Parece que a Cláudia repete sempre a mesma vilã quando é designada para esse tipo de personagem. Vamos ver se nos próximos capítulos, a Cláudia consegue acertar o tom e dar uma personalidade à sua Lívia.

Juliano G. Bonatto disse...

Gostei do primeiro capítulo e do segundo. Só nao gosto de novelas com elenco grande. Fiquei traumatizado com Páginas da Vida. Vamos ver se Glória consegue conduzir esse batalhão melhor.

Walter de Azevedo disse...

Excelente texto, Duh! Glória é das poucas que ainda faz o novelão clássico. As pessoas precisam entender que existe público para vários gêneros dentro da Teledramaturgia. Gostei do que vi até agora. Vamos aguardar pra ver o que acontece.

André San disse...

Boa análise! Gosto muito de Gloria Perez, mas ela vem se repetindo demais, como se tivesse criado um molde de sucesso e o utiliza sempre, apenas trocando as etiquetas. Vi algo de rançoso nos primeiros capítulos, um deja vu desagradável. Todo autor se repete, é fato, mas Gloria tem uma identidade muito forte, e sua trama carrega demais em tudo o que já foi visto antes. Não vejo diferença na trama principal com América. Concordo que a mocinha foi mais bem apresentada, a ambição de Sol não colou, mas, mesmo assim, as semelhanças gritam mais que as diferenças. Fora que novela carregada de personagens me incomoda. Abraço!
André San - www.tele-visao.zip.net