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terça-feira, 29 de março de 2011









A ingrata missão do agente secreto
por Fernando Russowsky

Há um tempo, elaborei um texto sobre
Araponga, que foi enviado a uma lista d
e discussão e postado na comunidade Teledramaturgia, do Orkut. Neste dia 29, a exibição do último capítulo da novela completa 20 anos. Aproveito o ensejo para, com algumas pequenas modificações, compartilhar com os nobres leitores deste blog o que escrevi:

Faço parte da meia dúzia de quatro ou cinco que, com a estreia de Araponga, passou a assistir Pantanal apenas aos sábados. Sem desmerecer o primoroso trabalho apresentado pela Rede Manchete, isso não me trouxe nenhum prejuízo para o entendimento da trama...

Concebida originalm
ente como a novela das oito que sucederia Rainha da Sucata, teve como títulos provisórios Os Clones e Ponto Futuro e, como um dos temas principais, a engenharia genética. Como este era o assunto principal da novela das seis da época, Barriga de Aluguel, a Globo achou melhor não levar a novela ao ar e chamou Cassiano Gabus Mendes, que escreveu Meu Bem Meu Mal. Me lembro que o senador Petrônio Paranhos (Paulo Gracindo, que em três dos quatro capítulos nos quais apareceu foi como um morto animado por outras pessoas para parecer vivo - uma referência ao seu trabalho como Quincas Berro D'Água?) deixou material para fazer um filho com Arlete (Carla Marins) por meio de inseminação artificial. Será que na sinopse original o senador pretendia produzir um clone de si próprio, antecipando em onze anos a abordagem da clonagem humana na telenovela brasileira? Por fim, Araponga estreou em 15 de outubro de 1990 "em regime especial", como chegou a ser divulgado em algumas notas na época, às 21:30, com modificações no roteiro, dando menos ênfase à questão genética.

Acredito que esta é, senão a mais, uma das mais injustiçadas de todas as novelas. A televisão brasileira passava por um momento sem precedentes: consolidada a liderança global, nos anos 70, foi a primeira vez que uma novela de outra emissora era, com todos os méritos, campeã de audiência e, principalmente, de repercussão. Araponga estreou com a "missão impossível" de trazer de volta à Globo o público do horário após a novela das oito. Tinha atributos para isso, mas, definitivamente, o momento era de Pantanal, cujas novidades quanto ao ritmo e à narrativa eu creio que a imprensa e o público ainda estavam assimilando (algo como uma criança com brinquedo novo). Por isso, acabaram não prestando a devida atenção às inesquecíveis atuações de Tarcísio Meira (Aristênio Catanduva - Araponga), Zilka Salaberry (Dona Marocas), Taumaturgo Ferreira (Tuca Maia), o que eu considero o trabalho mais divertido de Flávio Galvão (João Paulo - só neste trabalho eu consegui me livrar da imagem que eu tinha dele como o diabo em Corpo a Corpo) e a minha então musa inspiradora, Carla Marins (Arlete), entre vários outros injustamente omitidos aqui. Araponga foi a primeira novela de Luiza Brunet (Dalila - aparecia uma vez a cada vinte capítulos) e Dira Paes (Nininha). Também resgatou nomes como Monique Lafond (Elizabeth), Elizabeth Gasper (Marieta) e Darlene Glória (Dayse). O texto ágil, inteligente e crítico acabou sendo qualificado de “bobo”, “ridículo” e outros termos ainda mais desabonadores. Como não conseguiu reverter o quadro favorável à concorrente, a Globo praticamente desistiu de Araponga. Sem levar em consideração seu público pequeno mas fiel, por várias vezes deixou de apresentar o capítulo para exibir filmes, especiais e, mais raramente, futebol. Me lembro que nas semanas entre o natal e o ano-novo, só houve exibição de quarta à sexta. Em janeiro, a duração dos capítulos foi reduzida de 1 hora para 45 minutos, com comerciais. E o término da novela já estava decretado para 29 de março de 1991, sexta-feira. Na semana seguinte estrearia a nova linha de shows da emissora.

Eu gostava muito do humor non-sense da novela, com tiradas dignas de desenho animado, como quando Tuca Maia fala co
m Dalila ao telefone (na época não havia celular) e diz: "Tô indo praí". Dalila desliga. Toca a campainha da casa dela, ela atende e é Tuca Maia. Contando talvez não tenha a mesma graça... Ou a cena em que Araponga e Mão-de-Gato (Yvan Mesquita em participação especial) explodiam um cofre e acabavam destruindo o cenário da gravação que acontecia no estúdio ao lado. Teve também a cena em que Tuca Maia (de novo) entra num taxi e manda o motorista seguir um carro à frente. O motorista vibra: "Legal, igual filme americano!". Terminada a corrida, Tuca paga e pede o troco, o motorista reclama que em filme americano o passageiro não pede o troco. Tuca responde: "É, mas isso aqui é novela!" (pra quem tinha dúvidas em relação ao que Araponga era realmente...).

Uma observação curiosa é que, embora sua audiência não tenha sido expressiva, teve considerável repercussão. Tanto que profissionais que trabalham com grampos telefônicos
receberam a alcunha e ainda hoje são identificados como "arapongas". Muitas pessoas podem não lembrar da novela, mas lembram da "urinolina", o combustível alternativo sobre o qual foram feitas milhares de pesquisas (principalmente para resolver seu maior inconveniente, o mau cheiro) para no final descobrirem que era inviável. Seria uma crítica ao Proálcool, que à época enfrentava sua pior crise? Ou uma profecia, como aponta esta matéria? O regime militar também não foi poupado, principalmente as organizações secretas (como a que Araponga fazia parte) e a tortura (o detetive se trancava no quarto, se pendurava num pau-de-arara e se dava choques).

Tenho pra mim que Araponga foi uma obra genial,
a novela certa no momento errado. Merecia ter sido tratada com mais consideração.

3 comentários:

Unknown disse...

Não sei se o Fernando ou mais alguém se recorda disso, mas houve uma cena inacreditável em "Araponga" em que o personagem do Ary Fontoura teve a ideia de usar uma camisinha que tocava música ao transar com sua esposa, vivida por Eloisa Mafalda, seu par mais constante na TV.

FBVR disse...

Bah, lembro sim! Aquela camisinha fez sucesso, depois o filho do personagem do Ary Fontoura, o Peracinho (Edgar Amorim), resolveu usar com a Arlete (Carla Marins). E eu, na flor dos meus 13 anos, vendo a Carla Marins... bah

Walter de Azevedo disse...

Fernando, eu me divertia demais vendo Araponga! O humor cínico do Dias Gomes era perfeito, sem contar o elenco. Legal é que a direção do Cecil Thiré teve fôlego para aguentar as loucuras escritas por Dias, Lauro César Muniz e Ferreira Gullar.
Araponga me salvava de Pantanal, que sempre achei chata e parada demais rsrs. Realmente, uma novela muito injustiçada!