Oi, oi, oi!
Avenida Brasil se consagra um dos maiores sucessos
dos últimos tempos
por Duh
Secco
Não há um único brasileiro sequer que, nos últimos
tempos, não tenha ouvido comentários acerca de Avenida Brasil, novela das 21h que se encerrou hoje. Mais do que um
sucesso de audiência, a trama de João Emanuel Carneiro se sagrou como um
verdadeiro fenômeno de repercussão. Não esteve só na boca dos telespectadores
ou nos bolões de aposta em torno do misterioso assassinato de Max (Marcello
Novaes). O mérito de Avenida Brasil,
no que tange à seus reflexos perante o público, se deu principalmente pelo fato
do roteiro não conter nenhuma possibilidade de conteúdo transmídia e mesmo
assim ter mobilizado o público da internet, nos meses em que esteve no ar. É um
caso diferente do de Cheias de Charme,
que fez da rede uma aliada no desenrolar de sua trama e consequente propagação
de seu sucesso. A novela das 21h se valeu do carisma de seus personagens,
incluindo a maquiavélica Carminha (Adriana Esteves), e dos acertos e erros de
seu roteiro para eclodir em comentários nas mídias sociais.
Avenida
Brasil começou com um prólogo
eletrizante, que contava a trajetória da pequena Rita (da pequena e talentosa
Mel Maia), abandonada em um lixão pela madrasta Carminha e seu amante Max, após
a morte de seu pai, Genésio (Tony Ramos). Os primeiros capítulos, bem como o
decorrer de toda trama, ficaram marcados pela estética de cinema imprimida pela
direção de Amora Mautner e José Luiz Villamarim, sob o núcleo de Ricardo
Waddington, que trouxe iluminação e enquadramentos diferenciados, que em certos
momentos davam a impressão de que o público espionava os acontecimentos da
trama por uma pequena fresta, nos ambientes em que as cenas se desenrolavam.
Sem sombra de dúvida, a direção foi a maior responsável pelo espetáculo que se
viu na tela nos últimos meses, ao orquestrar, de modo perfeito, o roteiro
eficiente do autor, a produção impecável, e o talento do elenco reunido nesta
produção.
Adriana Esteves foi uma Carminha irrepreensível;
Débora Falabella (Rita / Nina) cumpriu bem sua função de mocinha com caráter
dúbio; Cauã Reymond se esforçou para imprimir veracidade à Jorginho,
constantemente perturbado pelos seus traumas do passado; e Murilo Benício
(Tufão), mais uma vez, se sagrou vitorioso na composição de seus personagens.
Seria injusto mencionar um ou outro ator do elenco que tenha se sobressaído, já
que praticamente todos estiveram muito bem. Menções honrosas para José de Abreu
(Nilo), Juliano Cazarré (Adauto), Marcos Caruso (Leleco), Otávio Augusto
(Diógenes) e Ísis Valverde (Suelen). Além, é claro, de
Cacau Protásio, que passou de coadjuvante a protagonista dos momentos mais
divertidos da novela. O público passou a aguardar ansiosamente cada aparição de
sua Zezé. Lamenta-se a repetição de tipos que permeiam a carreira de
Ailton Graça, desta vez como o malandro Silas, e o tom atribuído por Heloísa
Perissé à sua Monalisa, idêntico ao de seus personagens anteriores, mesmo
estando diante de algo diferente do que fizera anteriormente.
A trama muito bem urdida de Avenida Brasil deu possibilidades a todos os integrantes do elenco
e conseguiu prender a atenção do público, ainda que sérios deslizes nas
situações tramadas por João Emanuel Carneiro tenham comprometido a narrativa.
Foi o caso da vingança de Nina, que se revelou falha no decorrer da novela, já
que, depois de muito ouvir atrás das portas, a única prova que a cozinheira
possuía contra sua algoz eram fotos dela em pleno ato sexual com Max. Fotos
essas que desemboracam em um erro ainda maior: em plena era tecnológica (e Nina
se aproveitara muito bem da tecnologia quando necessário), a mocinha entregou
cópias impressas dos arquivos a amigos de
confiança e se esqueceu de armazenar as mesmas em um pen-drive ou qualquer
coisa do tipo. João Emanuel Carneiro se justificou, alegando ser uma analfabeto
digital e se apoiando na liberdade criativa do processo de escrita de uma
novela. Mas tal liberdade não condizia com o roteiro (até então) crível que
vinha sendo apresentado. A vingança de Nina também empacou no episódio do
dinheiro do sequestro de Carminha, que se multiplicou nas mãos da namorada de
Jorginho e serviu para que ela comprasse Max, por quem se dizia apaixonada,
mesmo se negando a transar com ele. Era de se entender que a mocinha da novela
não pudesse se deitar com o vilão. Mas ficou difícil de aceitar que o vilão
aceitaria as desculpas da garota por tanto tempo.
Por outro lado, dá para entender que a revelação de
Nina sobre o verdadeiro caráter de Carminha era fundamental para o desenrolar
da novela. Para se obter uma vaga noção do quanto a manutenção desta trama era
necessária, basta se atentar para os capítulos exibidos nesta última semana.
Carminha, após a morte de Max, vai morar com Santiago (Juca de Oliveira), seu
pai, que se revela como grande vilão. A submissão da loira ao pai é algo
aparentemente inexplicável, uma vez que os dois já haviam se enfrentado em
ocasiões anteriores, nas quais Carminha nunca demonstrou o medo e a resignação
que pareceu ter com o pai, articulador de um sequestro mal ajambrado de Tufão,
motivado por uma até então desconhecida fortuna utilizada pela família do
jogador para abrir um nunca antes comentado shopping no bairro do Divino. De
tramas equivocadas como esta a furos como o de Nina, que saiu do banco com um
milhão em espécie (um erro sobre o qual ela havia alertado seu pai, quando
ainda era pequena) e a presença de notas utilizadas para o pagamento do
sequestro de Carminha e que serviram para incrimar a cozinheira, quando esta já
havia gastado todo o dinheiro; até situações óbvias que contribuíram para o
encaminhamento dos momentos finais, como Ivana (Letícia Isnard), desconfiada
que só, falando sobre o shopping na frente de Carminha ou o sequestrador de
Tufão parar para abastecer o carro e ser flagrado por Nina. Entre bons
momentos, e outros não tão bons assim, Avenida
Brasil foi seguindo até o seu derradeiro capítulo.
A imprensa já havia adiantado praticamente
todos os acontecimentos deste final, o que dizimou por completo a surpresa do
mesmo: Carminha atirou no pai, salvando Nina e Tufão. A cozinheira esquecera do
mal que a madrasta lhe fez e a perdoou. Uma atitude até que aceitável, não
fosse o fato de Nina ter dedicado sua vida a destruir sua madrasta. O embate
final das duas, que acabou desembocando em um perdão recíproco, não condiz com
a trajetória de ambas ao longo de toda a narrativa. Ficou difícil para o
telespectador digerir o fato de Carminha ter se redimido após passar um curto
período de tempo sob o domínio de seu pai. E também que Nina tenha se
influenciado pelo fato de Carminha ter salvo sua vida duas vezes (quando atirou
em Santiago e quando matou Max) a ponto de esquecer o passado de tragédias pelo
qual teve que passar ao ser jogada no lixão pela vilã.
Nada disso, entretanto, se converte em demérito para
a novela, vista por todas as classes sociais, embora a imprensa tenha sempre se
preocupado em frisar que se tratava de uma trama concebida para a classe C. Há,
em todos estes comentários, um claro erro de interpretação, que não permitiu que
críticos mais ferrenhos vissem que Avenida
Brasil é sobre a classe C, mas com uma narrativa voltada para todas as
classes. Se não fosse assim, não haveria a necessidade de um núcleo rico,
capitaneado por Cadinho (Alexandre Borges) e suas três mulheres. Muitos
rejeitaram tais personagens, fundamentais na história, já que simbolizavam um
respiro dentro da narrativa pesada da novela. João Emanuel Carneiro é afeito a
núcleos que funcionam como sitcoms dentro do contexto da obra. Em Da Cor do Pecado, as tramas paralelas eram tão
desconexas da central, que isto ficava visível até mesmo na divisão dos blocos:
o primeiro e o último eram voltados para os protagonistas e os dois do meio
para a comicidade dos Sardinha, do pai Helinho (Matheus Nachtergaele) e do casal
falido Edu (Ney Latorraca) e Verinha (Maitê Proença).
Muitos também torceram o nariz para a trilha sonora
popular, que nada mais é do que um reflexo do atual momento da música
brasileira, onde grandes intérpretes se preocupam mais em lançar álbuns para os
críticos do que com a execução de suas músicas na rádio, deixando para esta a
reprodução de canções de refrão repetitivo, como as que permeavam as cenas da
novela e condiziam perfeitamente com a narrativa.
Enfim, Avenida
Brasil chegou ao seu final. Cheia de deslizes, que a impede de figurar
entre as obras-primas da dramaturgia nacional; e de méritos que a colocam como
uma das novelas de maior sucesso dos últimos tempos.
7 comentários:
Cheia de deslizes, que a impede de figurar entre as obras-primas da dramaturgia nacional?
Que equívoco essa declaração!
Sua opinião, mas não é o dono da verdade!
Ela já figura entre as obras primas.
Duro agora é se acostumar com as obras requentadas e com fórmulas repetidas ao extremo!
:)
Exatamente, Fábio. Minha opinião; talvez em dissonância com a grande maioria e certamente contrária a sua. Mas o que seria das novelas senão fosse as diferentes visões de cada telespectador? Obrigado por ler minha análise.
Ela já está um patamar acima, acho que nem só por Leleco e Zezé que tiveram forte apelo popular, mas principalmente por Carminha que virou cult por dizer em voz alta o que muitos pensam e são calados por uma sociedade "civilizada".Claro que houve mesmo uma enrolação nessa vingança que o autor não soube conduzir muito bem, pois essa demora não condizia com a sede de revanche da protagonista, mesmo tendo ela se apegando à família( algo que ela não sabia que ia acontecer). Quanto ao shopping, não estou desculpando, mas foi falado sim em algum capítulo como um possível investimento da família Tufão...de onde saía tanto dinheiro,só Gilberto Braga deve saber.... mas concordo com o Fábio numa coisa, vai ser difícil acostumar de novo com tramas mais comuns, se bem que se deve respeitar cada estilo autoral. Respeitar, não gostar.Excelentes observações, Duh....desculpe se me estendi muito, sou prolixo mesmo.
Entre erros imperdoáveis e acertos louváveis, furos de amador e catarses de gênio, Avenida Brasil chega ao fim como a melhor novela das 9 em anos para mim e um fenômeno absurdo de repercussão. A mim, apesar de também não considerá-la excelente, deixa saudades e prova que mesmo nesses tempos em que se fala de queda na audiência e crise nas telenovelas, o gênero ainda é capaz de mobilizar e parar o País. E, aliada às novas tecnologias transmídia, reflete um novo jeito de fazer e assistir televisão.
Agora só resta desejar sorte à sua substituta Salve Jorge e esperar um JEC mais aperfeiçoado novamente daqui a uns anos.
Só queria comentar sobre dois furos apontados. Quando Tufão vendeu sua parte do negócio dos salões, falou-se sobre a possibilidade de abrir um shopping. A grande parte do dinheiro do sequestro, 15 milhões, veio daí.
Até hoje, eu nunca encarei essa questão da Nina não ter mais cópias de segurança da fotos como furo. Pra mim, ficou muito claro que ela nunca quis mostrar essas fotos pra família do Tufão, pois sabia que todos sofreriam. E se essas fotos tivessem sido armazenadas em outros meios, seria apenas questão de tempo, ou de mais capítulos, para que a Carminha as recuperasse. Um pen drive seria tão fácil de recuperar quanto as fotos impressas, e um armazenamento virtual poderia ser apagado por um hacker. Bom, mas se o próprio autor confirmou o furo por sua falta de conhecimento tecnológico, não sou eu quem vai discordar.
No mais, parabéns pelo blog.
Achei "Avenida Brasil" um delicioso queijo suíço.
Gostei mais de "Cama de Gato" (do mesmo autor), mas é uma novela muito boa. Mas "Senhora do Destino" ou "Páginas da Vida" serão, para mim, as melhores novelas deste século.
Postar um comentário