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sexta-feira, 12 de outubro de 2012














Otávio e Charlô: e a guerra continua 30 anos depois ...

por Guilherme Staush



Há um ano, exatamente, o autor Sílvio de Abreu nos concedeu sua primeira entrevista aqui, no blog. Na época, já preparava o remake de um de seus maiores sucessos, Guerra dos Sexos, atualmente em sua segunda semana de exibição no horário das 7. E sobre a novela, o autor discorreu na época:
Sei que com “Guerra” estou arriscando comparações e que elas sempre serão favoráveis à versão original da novela e eu nem vou poder colocar a culpa no adaptador, porque eu mesmo estou refazendo. Mas arriscar é o que mais me motiva na minha profissão. Já disse várias vezes que o que me estimula são desafios.

De fato, Silvio está tendo um de seus maiores desafios na TV, e basicamente por duas razões: a primeira delas, por adaptar uma obra que é praticamente irretocável – “Guerra” representou uma inovação no horário, seja pela direção, pela comédia escrachada, pela interação dos personagens que se comunicavam falando diretamente com o público de casa, e pelas cenas de pastelão. É, até hoje, uma das maiores referências dentre as novelas exibidas no horário. E a segunda razão, e talvez a mais desafiadora de todas: conseguir extrair do elenco atual uma atuação tão marcante como a que foi obtida pelo elenco da versão de 83. Algo que nos permita admitir que este remake tem uma razão de ser.

Vale lembrar que, na versão de 83, os protagonistas Otávio e Charlô foram interpretados por Paulo Autran e Fernanda Montenegro, atores essencialmente do teatro, que atuavam pela primeira vez juntos, e protagonizavam cenas de pastelão impensáveis para dois atores daquele quilate (a famosa cena do café é uma das mais reprisadas pela TV até hoje). A novela tinha ainda o casal 20 da televisão brasileira, Glória Menezes (Roberta) e Tarcisio Meira (Felipe), que brigavam como cão e gato, para deleite dos telespectadores acostumados a ver os dois em cenas românticas; e Lucélia Santos, que depois de viver várias heroínas na TV, aparecia pela primeira vez como uma vilã. Vale ressaltar também as ótimas interpretações  de Yara Amaral (Nieta) e Mário Gomes (Nando), que inclusive ganharam o prêmio APCA de melhor atriz e ator daquele ano, juntamente com Fernanda e Paulo. Além disso, teve Cristina Pereira (como a impagável Frô), José Mayer (em sua estreia em novelas, como o lutador Ulisses), e Edson Celulari (interpretando seu segundo vilão, o Zenon). Apesar da pouca experiência dos três em televisão, cumpriram com mérito, o papel designado a eles.

De uma coisa Silvio estava certo: as comparações são mesmo inevitáveis, e no caso de Guerra, isso é ainda mais evidente, pois está se comparando uma obra-prima da TV, uma referência no horário, com uma nova adaptação. Tudo aquilo que fez da trama o grande sucesso que foi não é mais novidade na TV: o pastelão já foi utilizado à exaustão, e a novela já teve (possivelmente) os melhores atores para interpretar seus personagens. Resta ao autor REcriar uma história que ficou datada depois de 30 anos (a posição da mulher na sociedade de hoje é bem diferente da que foi retratada na trama de 83), e surpreender o telespectador que pensa que já conhece a história. E aos atores, cabe a difícil função de cativar o telespectador que vê a novela pela primeira vez, e superar as expectativas daqueles que viram a primeira versão.

A teledramaturgia tem apresentado nos últimos anos vários remakes, porém todos eles feitos por autores diferentes dos que escreveram o original, o que significa – pelo menos em tese - uma releitura das obras. Tivemos novas adaptações de Irmãos Coragem, Pecado Capital, Anjo Mau, Ti Ti Ti e O Astro, por exemplo. Entretanto, vimos poucos remakes feitos pelo autor que escreveu o próprio original. Mulheres de Areia e A Viagem foram os últimos, se não contabilizarmos os remakes das obras de Benedito Ruy Barbosa, “reescritos” por Edmara e Edilene. A versão de 1993 de Mulheres de Areia, escrita pela mesma Ivani Ribeiro que fez o original, apresentado 20 anos antes pela Rede Tupi, tinha a vantagem de ter sido uma novela quase que inédita para a grande maioria dos telespectadores, já que há pouquíssimos registros da primeira versão disponíveis, e consequentemente, pouco a se comparar. Por outro lado, embora a primeira “Guerra” já tenha 30 anos (mais tempo do que o espaço entre as duas versões de Mulheres de Areia), com o avanço tecnológico dos últimos tempos, é possível baixar a primeira versão da novela na íntegra pela internet, comprar os dvds com as gravações de todos os capítulos, ou ainda assistir cenas avulsas, alocadas no Youtube. Ou seja, mesmo o telespectador mais jovem pode ter acesso à obra original.

Ainda assim, independente de qualquer comparação (justa ou não) que possamos fazer entre a original e o remake, os problemas da atual versão saltaram aos olhos já no momento em que foi divulgado o clip de lançamento da novela. E, decorridos 11 capítulos, o maior problema da novela, a meu ver, está na direção. Jorge Fernando é um ótimo diretor, mas precisa se atualizar urgentemente. Seus últimos trabalhos têm sido bastante repetitivos, trazendo um humor fácil, forçado e ultrapassado, com interpretações exageradas e caricatas, e tudo isso visto em novelas de um mesmo autor – Walcyr Carrasco – com quem o diretor mais trabalhou nos últimos 10 anos.

O que se nota em “Guerra”, é que não há uma uniformidade na interpretação dos atores. Enquanto Mariana Ximenes e Mayana Moura, por exemplo, dão um tom mais dramático às suas Juliana e Veruska, respectivamente, Glória Pires e Reynaldo Gianecchini exageram na comicidade de Roberta e Nando. O segundo, definitivamente, ainda não encontrou o tom de seu personagem. Está praticamente o Pascoal, o mecânico que interpretou na novela Belíssima, apenas com cabelo e figurino diferentes.

Os excelentes Tony Ramos e Irene Ravache são atores experientes, e certamente, mais tarde, irão deitar e rolar com as cenas de Otávio e Charlô. Precisam se livrar desse tom mais teatral que estão dando às cenas, utilizando um humor forçado, como se seus personagens estivessem “brincando”. É preciso passar credibilidade na rivalidade entre os primos, com um cinismo mais natural e sutil, que é a característica mais marcante de seus personagens. Para que uma cena seja engraçada, não há a necessidade de transformar os personagens em dois palhaços. Às vezes, a ironia e a sutileza podem ter uma graça bem maior.

Edson Celulari está muito bem como Felipe, e Drica Morais conseguiu reinventar uma bela Nieta, apesar da referência “monstruosa” que a personagem tem. O núcleo mais penoso, entretanto, é, sem dúvida o da casa de Semíramis (Débora Olivieiri), onde vive o já citado Nando. Eriberto Leão é um dos atores mais inexpressivos da atualidade, e Marianna Armellini destruiu toda a graça da personagem Frô, magistralmente interpretada por Cristina Pereira na primeira versão (é nessas horas que o telespectador percebe a importância de uma escalação adequada).

Na última quinta-feira, foi ao ar a antológica cena do café da manhã, onde os primos Charlô e Otávio se declaram guerra, jogando tudo que tem na mesa na cara um do outro. Obviamente a cena não teve a mesma graça da que já foi vista inúmeras vezes na TV. A ideia de transpor imagens da primeira versão com as atuais não funcionou bem, tirando um pouco o brilho da cena atual e valorizando, por algumas vezes, as imagens de arquivo. Mas, claro, “Guerra” não é só isso, e certamente há muitas surpresas reservadas ao longo da novela. Silvio é um autor experiente e já deu provas de sua habilidade por diversas vezes (quem não lembra da mudança radical nos rumos de Torre de Babel, quando a novela já estava no ar?). A atual Guerra apresenta uma série de personagens interessantes , e que podem ser bem explorados com diversas tramas no decorrer da história. 

As referências a outras novelas, que foram bem marcantes em 83, continuam a todo vapor nesta versão (e que delícia são essas metalinguagens televisivas!). No capítulo de quinta-feira mesmo, a personagem Nieta, assistindo à reprise de Da Cor do Pecado, faz um sutil comentário que serviu justamente para o remake de Guerra dos Sexos: “De repente eles mudam a história. Vocês não sabem que essa gente de televisão é tudo meio louca?”

A novela está apenas no início, e certamente há muito para se analisar. São apenas as primeiras impressões de um produto que ainda tem muito o que oferecer em seus quase 180 capítulos de exibição.
Mas, acima de tudo, cabe ao diretor Jorge Fernando segurar as rédeas, trabalhar um pouco mais as sutilezas subjacentes ao texto de Sílvio, evitar os exageros, e não esquecer que, dirigir uma novela essencialmente cômica, não significa exatamente promover um espetáculo circense em cena.



8 comentários:

Fabio Dias disse...

E X C E L E N T E crítica, uma das melhores que já li sobre a novela!
Parabéns, assino embaixo!

Juliano G. Bonatto disse...

Estou gostando da novela, apesar dos pesares. O que mais me incomoda é essa briga entre homens e mulheres, ultrapassadíssima para os dias de hoje.
Estou gostando da Glória Pires.

Valéria disse...

Concordo com algumas coisas e discordo de outras. Mas estou amando a "Roberta" de Glória Pires. As cenas de Roberta e Felipe são as minhas preferidas. Ela e o Edson têm química. Espero que dessa vez, a Roberta fique com o Felipe.O Gianecchini está destoando do elenco. Não convence como Nando.

Guilherme Staush disse...

Eu estou gostando muito do Dino nessa versão. Acho que ele está menos plasta (e não tão feio como na primeira versão...rs). Cheguei até a torcer para que ele tenha mais sorte com a Roberta dessa vez, na última cena que vi dos dois.

O Midiático disse...

EXCELENTE análise, Guilherme! pontos primordiais.
O que acontece é que parte do público está com mal vontade com a novela. Antes mesmo dela começar, já estavam metendo o pau. E, sim, agora a novela está no ar cheia de problemas, mas sabemos que se trata de uma história excelente e, como ainda está no início, o Silvio vai poder mexer e dar um UP... Eu torço para que Guerra dos Sexos conquiste o público.

André San disse...

Bela análise. O principal desafio de Guerra dos Sexos é realmente atualizar uma batalha que se modificou muito nos últimos 30 anos. Silvio tanto bateu na tecla de que a nova Guerra seria uma nova novela, então ainda estou esperando a novidade. Só discordo quanto ao tom de Irene Ravache e Tony Ramos, que estão mais cômicos, sim, mas sem descambar pra caricatura. Estão dando sua marca aos personagens, ao invés de imitar o que Fernanda Montenegro e Paulo Autran fizeram, o que acho positivo. E também discordo da crítica à atuação de Gloria Pires: ela tem sabido manter o humor sem perder a naturalidade que tanto caracteriza seu trabalho. De longe, a melhor atriz do elenco. Abraço!
André San - www.tele-visao.zip.net

Rodrigo disse...

Para os que reclamam da novela, guardem as críticas para quando entrar em cena o modelo Jesus Luz e aquela filha da Glória Pires.
Não sei, não. Será que eles atuam bem mesmo ou são apenas estratégias de marketing?
Posso estar enganado, mas duvido muito que eles estejam no elenco dessa novela por causa de talento.
Não sei quais os critérios que a Globo usa para testes de elenco, mas acredito que QI seja o principal.

A Thammy Miranda em "Salve Jorge" é outro exemplo, mas esta vai fazer o papel de si mesma e não vai comprometer.

Rodrigo disse...

Depois de três semanas no ar, sinceramente, estou achando tudo careta e sem
graça demais. Pra mim, o Silvio terá que parar de brincar de fazer copy-paste e
trabalhar de verdade se quiser que "Guerra dos Sexos" emplaque, o que eu acho
pouco provável de acontecer.

O autor e o diretor foram arrogantes desde o início do projeto. Todos falaram
com eles que a novela estava datada, mas eles não deram importância nenhuma pra
isso. Parece que não houve avaliação dentro da
emissora e nessas horas, falta um Boni mesmo. Simplesmente, o projeto foi
aprovado porque é do Silvio de Abreu e pronto! Ninguém discute mais.

O sucesso de "Ti-Ti-Ti" fez tanto a cabeça do Jorge Fernando que ele deve ter
pensado que automaticamente a nova versão de "Guerra" teria o mesmo resultado.

Não é possível que um autor como Silvio de Abreu que adora fazer questão de
dizer em todas as suas entrevistas que sempre inova em suas novelas não tenha
percebido que o tempo de "Guerra dos Sexos" já passou.

E pensar que a Globo perdeu o Carlos Lombardi, que hoje poderia estar no ar com
"João ao Cubo", uma novela que poderia ser bem mais interessante e,
principalmente, ENGRAÇADA.
Muito provavelmente, hoje o que Lombardi criou em "Guerra" é copiado, mas sem o
mesmo efeito. Não provoca riso porque eles estão fazendo uma releitura careta do
Lombardi também, não só do Silvio, apesar deste ser o autor mesmo.