Somos amantes da teledramaturgia. Respeitamos a arte e a criação acima de tudo. Nosso profundo respeito a todos os profissionais que criam e fazem da televisão essa ferramenta grandiosa, poderosa, que desperta os mais variados sentimentos. Nossa crítica é nossa colaboração, nossa arma, nosso grito de liberdade.



ENTREVISTAS EXCLUSIVAS

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quinta-feira, 7 de julho de 2011



LAURO CÉSAR MUNIZ






“Carinhoso”, “O Casarão”, “Roda de Fogo”, “O Salvador da Pátria” e “Cidadão Brasileiro” são alguns dos grandes sucessos do consagrado autor Lauro César Muniz, nome que não poderia faltar na nossa galeria de entrevistados.
A educação, a seriedade e o profissionalismo do escritor podem ser medidos até mesmo na realização de uma entrevista. O respeito e a dedicação que Lauro devotou ao nosso trabalho estão impressos em cada linha. Quem ler, verá ...



ENTREVISTA EXCLUSIVA



Guilherme Staush pergunta:
1. Enquanto que nos anos 70 os vilões eram odiados pelo público, que torcia desesperadamente pela felicidade da mocinha, na teledramaturgia atual há uma forte tendência dos telespectadores amarem os vilões e rejeitarem as protagonistas pelo fato de essas, ao longo da novela, cometerem atos injustificáveis, e não enxergarem aquilo que está óbvio aos olhos do grande público (a Marina, de “Insensato Coração”, atual novela das 9 da Globo, é um grande exemplo).
A personagem Odete Roitman, da novela “Vale Tudo” (Gilberto Braga, Aguinaldo Silva, Leonor Bassères), parece ser uma das grandes responsáveis por essa mudança de atitude do público. Na época da novela, em 1988, o público odiava a personagem. Com o passar do tempo, o telespectador passou a amar a Odete, concordando com a maioria das barbaridades que ela dizia.
Os vilões das suas novelas são sempre mais comedidos nesse aspecto, seja o Mário Liberato de “Roda de Fogo” (1986) ou o Atílio Salles Jordão, de “Cidadão Brasileiro” (2006).
Existe uma maneira de equilibrar mais essa dosagem que se imprime às características de mocinhos e vilões, sem que os primeiros pareçam ingênuos demais e os segundos simpáticos demais? Você acha interessante e saudável que o público se identifique tanto com os vilões nas novelas, e por vezes até torça por eles?

Vilões ou heróis são antes de tudo, personagens. E como tais devem ser humanos, contraditórios, viver com muita verdade suas ações e estarem justificados, de forma consistente, com relação às suas atitudes. Heróis ou heroínas protegidas pelos autores como exemplo de pureza ou virtude acabam se tornando sem verdade, daí certa aversão do público, nada ingênuo, às suas ações e falta de visão. Herói, em minha teledramaturgia, é sinônimo de mau personagem, sem vida real, sujeito a ingenuidades. Por isso tenho evitado heróis exemplares (agrh!), e nem desejo personagens centrais com essa carga de desequilíbrio. Vejam meus personagens centrais: Antônio Dias de “Escalada” não é um exemplo de virtude, é um lutador, ambicioso, quer vencer na vida e se alia por vezes a personagens sem escrúpulos. Tal é o caso de Fachini, seu patrão, dono de uma Construtora que ganha lícita ou ilicitamente concorrências para participar da construção de Brasília. O mesmo se dá com
Antônio Maciel, de “Cidadão Brasileiro”, Sassá Mutema de “O Salvador da Pátria”, que mente para ser considerado um herói, Tony Castellamare, que usa métodos da máfia para se infiltrar nela em “Poder Paralelo”, e as mulheres infiéis, como Marina em Escalada ou Luíza em Cidadão Brasileiro e Lina em “O Casarão”. Personagens reais, que vivem suas contradições entre a paixão e a obrigação a maridos que já não amam... Além dos personagens que você, Guilherme, citou: Mário Liberato de “Roda de Fogo” assim como Renato Villar, parceiro de Mário em uma organização criminosa, vilões reais, plenos de contradições. Um mais outro menos. E uma juíza, responsável por um processo em que Renato é réu, que acaba se apaixonando por ele. Busco não ser esquemático, criar fortes dados contraditórios em cada um dos personagens para que eles não fiquem simplificados, evitando assim o maniqueísmo fácil (o bem de um lado, o mal do outro – agrh!). Todos os personagens devem ser enriquecidos psicologicamente, tornando-se humanos, com seus defeitos e qualidades, evitando a simplificação que torna a história rasa.

Duh Secco pergunta:
2. Suas novelas para o horário nobre da Globo, nos anos 70, hoje são lembradas como clássicos, mas foram tachadas como obras de difícil aceitação pelo público e audiência mediana, na época de suas exibições originais. Sua primeira novela nesta nova fase da Record, "Cidadão Brasileiro", também foi considerada sofisticada demais para o padrão da emissora. Já na época de Poder Paralelo, você declarou que queria uma novela cheia de ação, dentro dos padrões da Record. Acredita que haja espaço, nos dias de hoje, para novelas como "O Casarão" e "Espelho Mágico"? O público tem preferência por tramas fáceis ou são as emissoras que impõem esse estilo? A dramaturgia retrocedeu?

Na década de 70 escrevi grandes sucessos de audiência como “As Pupilas do Senhor Reitor”, “Carinhoso”, “Corrida do Ouro” (início apenas, conduzida depois apenas pelo Gilberto Braga)... A audiência alta me deixava seguro, fez crescer meu salário na TV Globo, mas não me deixava plenamente em paz comigo mesmo. Foi quando o Daniel Filho me convocou para escrever a novela das 8. Desenvolvi uma sinopse e levei para discutir com o Daniel. Ele ficou com aquela sinopse... Vou aqui transcrever o resto de um depoimento que dei a um livro biográfico sobre meu trabalho: “LCM solta o verbo” de Hersh Basbaum:

“... eu havia escrito um caso especial que teve uma grande repercussão, O crime do Zé Bigorna, com Lima Duarte. É importante este adendo. Havia sido proibido pela censura, ninguém se preocupou muito com isso, era já uma rotina.(...) Inconformado, conhecendo a força de minha peça, eu pedi licença à Globo para ir pessoalmente a Brasília, tentar liberar o programa. Fui recebido depois de horas na ante-sala, pelo Romero Lago, o chefe da censura naquele momento.(...) Consegui a liberação, o programa foi ao ar com enorme repercussão. Depois de tantas coisas proibidas, O crime do Zé Bigorna pareceu um oásis de tolerância, gerou certa perplexidade na imprensa de esquerda, que ainda resistia a ditadura.

Sobre o meu projeto para a nova novela das oito, Daniel disse: “não reconheço nessa sinopse o autor de O Crime do Zé Bigorna”. Fiquei admirado! “O que você escreveu aqui pode fazer sucesso, mas não tem a verdade do Zé Bigorna. Se você quiser, podemos fazer essa novela, mas acho que você pode me dar uma história mais real”. Aquilo foi uma porrada em meus brios e eu disse que precisava de mais uns dez dias para repensar a história. Poucos dias depois voltei com outro tema completamente diferente, que se chamava Escalada, baseada na história de meu pai. Uma história epidérmica, vivenciada, sofrida, visceral como O crime do Zé Bigorna.”

“Escalada” fez sucesso, deu boa audiência e então me animei, estimulado pelo Daniel, e criei “O Casarão” e “Espelho Mágico”, novelas de estruturas complexas, que desafiavam um pouco os padrões do horário. A audiência de “O Casarão” se manteve em nível bom e trazia à emissora prestígio e prêmios especiais. Me deram licença para apertar o torniquete e então fiz uma novela de estrutura bem mais complicada. Também houve honrarias, mas nesse caso a audiência se ressentiu. Não ao nível do absurdo, mas caiu da média geral do horário.

Não me importei, fiquei feliz eu, com o resultado e a qualidade. Claro que isso gerou também boas consequências, as novelas adquiriram um nível muito melhor. Era preciso coragem e os responsáveis na época correram o risco.

“Cidadão Brasileiro” não estava acima dos padrões do público. Era quase um remake de “Escalada”, com modificações de épocas e mais liberdade de expressão, sem a censura da década de 70. O problema maior era de produção e exibição sem ter um horário fixo. A TV Record estava ainda testando uma grade e não tinha as ótimas condições de produção que tem hoje no RecNov. O mesmo aconteceu com “Essas Mulheres”.

Quanto a “Poder Paralelo” foi um novela muito bem sucedida, com o padrão de audiência das novelas que estão no ar nos três últimos anos. É preciso considerar que a grande maioria dos capítulos dessa novela foram exibidos depois das 23 horas, cedendo o horário das 22 horas para o reality-show (A Fazenda).

As emissoras infelizmente ainda estão cativas de um conceito equivocado de que é preciso baixar o nível porque houve a ascensão de uma nova classe média que se supõe de baixo nível de exigência. Porém o que eu percebo nos muitos group-discussions que participei e em cartas e e-mails que recebo, é que público não é ignorante e, ao contrário, tem se queixado da baixa qualidade das novelas atuais. Dê qualidade ao público e ele reconhecerá. É preciso ter consciência também que está crescendo muito o público das emissoras por assinatura, a TV paga. Não apenas nas grandes capitais, mas em todo o país pela força das antenas parabólicas. As emissoras estão percebendo isso aos poucos... Todos estão buscando caminhos, inclusive fazendo uma revisão da extensão da telenovela. Novelas mais curtas trarão mais qualidade, por vários motivos. Abaixo esclareço isso melhor.

Guilherme Staush pergunta:
3- Você é mentor de uma campanha que visa a redução de capítulos das novelas com o objetivo de melhorar a qualidade das mesmas. Nós, da equipe do “Agora”, sondamos alguns de nossos autores entrevistados, e eles têm se mostrado simpáticos a causa. Poderia nos contar mais a respeito de sua campanha e como está seu desenvolvimento? Como seus colegas estão reagindo?

Tenho recebido a adesão de vários colegas autores, diretores, atores e atrizes. E até de agentes de publicidade. Sinto que o formato de novelas muito longas tem os dias contados. A tendência é que haja uma diminuição de capítulos nas novelas do futuro. O cinema e o teatro já entenderam que o público jovem de hoje quer dinamismo – o conceito básico produzido pela internet! Ora, a telenovela está na contramão: hoje se faz novelas com mais de 200 capítulos, que se arrastam, sofrendo de dinamismo. 200 capítulos exigem muitos núcleos. Uma história com muitos núcleos paralelos tende a ficar sem foco. A história central fica diluída, sem personagens centrais determinantes. Se a novela não tiver uma linha central bem nítida, o interesse cai, gerando as "barrigas" que afastam o público. A audiência oscila e só vai retomar os melhores índices ao caminhar para o final.

Peço licença para ser um pouco didático: o ponto de equilíbrio financeiro de uma novela, em geral, está em sua metade, ou seja, uma novela de 200 capítulos se paga por volta do capítulo 100. O investimento é feito prevendo-se 200 capítulos (pouco menos, pouco mais), com um enorme número de personagens (50, 60, às vezes muito mais), porque é necessário contar a história com muitas ramificações paralelas. Muitos personagens e histórias paralelas exigem muitos cenários, figurinos, várias frentes de gravações com muito diretores, etc...

Se reduzirmos o número de capítulos para 120 ou 140 capítulos, vamos fazer novelas com muito menos personagens, não mais do que 20, 25 atores! Consequentemente menos cenários, menos figurinos, menos locações de externas, menos núcleos paralelos, menos diretores. Na mesma proporção o ponto de equilíbrio financeiro da novela, seria em volta de 60, 70 capítulos. O lucro poderia ser o mesmo, com grandes vantagens: maior força na história central com núcleos paralelos servindo à história principal, o que resultaria uma unidade maior, menos dispersão. Uma história contada em quatro ou cinco meses, com a qualidade dos bons romances (best-sellers ou clássicos). Ganhará o público que hoje está enfadado.

Para as emissoras não haverá perda de lucro e para os atores, diretores e autores vai aumentar o número de produções por ano (dobraria), gerando mais espaços de atuação, enfim, mais empregos! Novos autores seriam revelados, dando lugar para os jovens! Os bons colaboradores teriam muito mais oportunidade de escrever suas próprias novelas. E os grandes atores que fugiram da telenovela, voltariam para interpretar papéis com duração de 5 meses apenas pois os personagens teriam mais coerência e organicidade.

Os autores voltariam a escrever mais, não dividiriam tanto a escrita com os colaboradores, o que hoje acontece, gerando um sistema de trabalho semelhante a uma linha de montagem, descaracterizando estilos, virando uma torre de babel. O "fordismo" da escrita.

Enfim, forma e conteúdo se inter-relacionam: forma mais dinâmica com certeza vai gerar melhor conteúdo! Estou nessa cruzada pelas novelas curtas, não em causa própria, porque vou parar de escrever antes que elas sejam rotina.

Fernando Russowsky pergunta:
4. Coube a você a tarefa de concluir "O Bofe", imprimindo à trama, na qual "o deboche era a estrutura" e as personagens "não se comportavam com sensatez, mas ao sabor da piada", uma "lógica encomendada", segundo palavras de Ismael Fernandes. A alguém com menos de 40 anos e que, portanto, não viu e nunca poderá ver a novela, já que é considerada perdida, como você explicaria a proposta? O que tinha de tão diferente? Por que é considerada tão absurda? Há alguma novela ou programa mais recente que sirva como base para comparação?

Bráulio Pedroso, o autor de “O Bofe”, foi dos autores mais criativos da telenovela. Fez “Beto Rockefeller”, “Superplá”, “O Cafona” antes de “O Bofe”. Assumi a novela para solucionar um problema de saúde do Bráulio, uma hepatite. Obviamente falei com ele na época antes de assumir a novela. Ele não tinha mesmo condições de escrever. Não tem sentido nenhum a frase “as personagens não se comportavam com sensatez, mas ao sabor da piada". Quem teria dito isso? Os personagens eram excêntricos, o que era muito interessante, gerando
situações farsescas, que lembravam o “teatro do absurdo”. Ziembinski fazia uma velha divertida. A história tinha um anarquismo hilariante. Não me encomendaram lógica nenhuma, isso é um equívoco do jornalismo da época. Ninguém me impôs nada! O que aconteceu é que imprimi meu estilo que era bem diferente do estilo do Bráulio. Coloquei a novela em um tom mais realista sem, no entanto, perder o universo cômico e mágico. O Bráulio deveria voltar e retomar a novela. Não voltou, até onde eu sei, por que estava realmente em situação física difícil. O José Wilker me disse, há poucos dias, que o Bráulio foi desligado da Globo na época. Eu não tive conhecimento disso, durante a novela. Depois eu soube que ele fora para a Tupi onde fez “A Volta de Beto Rockefeller”. Estive com ele várias vezes depois de O Bofe e nunca senti nele qualquer reação negativa. Fez depois várias novelas entre as quais eu destaco “O Rebu”, uma das melhores telenovelas de todos os tempos.


Daniel Pepe pergunta:
5. Você escreveu alguns trabalhos em parceria com outros autores, como Alcides Nogueira, Marcílio Moraes, Rosane Lima, Mário Prata, Gilberto Braga, entre outros. Destacaria um ou outro com quem teve/tem grande afinidade, deixando-lhe muito satisfeito com o resultado final? Como você costuma ponderar quando existem conflitos com outro autor ou colaborador quanto ao desenrolar da história ou de um personagem?

Tive problemas sérios com vários colaboradores que discordavam de meus pontos de vista sobre minha aversão ao maniqueísmo e às facilidades. Isso aconteceu recentemente com quase todos os autores com quem trabalhei em “Poder Paralelo”. Gostei muito de trabalhar com o Alcides Nogueira e o Mário Prata. Com o Marcílio Moraes fiz “Roda de Fogo”. Novela que nasceu com ele na Casa de Criação Janete Clair, onde tudo parecia correr muito bem.
Minha surpresa com o Marcílio apareceu bem depois quando fui supervisor dele em “Sonho Meu”, onde eu quis fazer uma alteração radical da história que era dele. A novela estava morna e havia uma rejeição do público com relação à história central em que a personagem era bígama! Recebemos a orientação para acabar com essa situação, eu concordei, mas o Marcílio ficou possesso, me agrediu de forma espantosa, alegando que tirei dele os méritos de Roda de Fogo! Fiquei espantado! Abaixo esclareço isso melhor.


Fernando Russowsky pergunta:
6- Ismael Fernandes afirma, em seu livro Memória da Telenovela Brasileira, que "Roda de Fogo" teve a sinopse "desenvolvida pela Casa de Criação Janete Clair, que a recheou de todos os entrechos capazes de seduzir os telespectadores". Entretanto, é notável na novela elementos constantes na sua obra, como o jogo do poder e a abordagem de questões políticas e históricas. Como se deu o processo de criação e condução de "Roda"? Onde, exatamente, terminou o trabalho da CCJC e começou o seu?

Em 1986, Roda de Fogo, ainda sem título, foi desenvolvida na Casa de Criação por vários autores em volta de uma grande mesa. Coube ao Marcílio redigir a sinopse e alguns capítulos iniciais. Eu não participei disso, nem conhecia a Casa. Moro em São Paulo. O Dias Gomes, que dirigia a Casa de Criação, assessorado pelo Ferreira Gullar, me convidou para escrever a novela, pois a direção da TV Globo exigia a participação de um Autor já experiente, assinando a novela. Sem a minha adesão ao projeto a novela não seria produzida. Eu já havia escrito minhas novelas principais. Topei trabalhar a sinopse inicial com o Marcílio, senti que tínhamos afinidades ideológicas e estéticas. A emissora aprovou com restrições à parte
romântica. Faltava alguma coisa para agitar as relações amorosas. O Daniel Filho, então, sugeriu a criação de uma personagem feminina que se transformou na base central da trama romântica! Uma personagem vivida pela Bruna Lombardi, uma juíza que se apaixonava por Renato Villar (Tarcísio Meira) que era réu de um processo que ela julgava. Há muito tempo o Daniel me falava dessa personagem sem que encontrássemos uma forma de colocá-la numa trama. Em Roda de Fogo isso era perfeito.
Minha relação com o Marcílio era ótima no decorrer da novela. Eu admirava seu talento e tinha certeza que surgia ali um novo autor. O problema surgiu depois, conforme já relatei acima: ele trancou longamente uma mágoa muito forte a meu respeito, que explodiu cinco anos depois quando fizemos “Sonho Meu”. Alegava que eu não divulgava seu nome como co-autor de Roda de Fogo! Ao contrário, nos créditos da novela eu tomei a iniciativa de colocar o nome dele antes do meu, por ter redigido e criado bastante a primeira sinopse. Está lá: “Escrito por MM e LCM”. Quanto à imprensa, era muito difícil o controle: o noticiário muitas vezes omitia o nome dele. Eu já havia escrito 12 novelas! Ele estava estreando. Ainda hoje muitas vezes eu leio que Insensato Coração é uma novela do Gilberto Braga, omitindo o nome do Ricardo Linhares. Que controle podemos ter sobre isso?


Duh Secco pergunta:
7- Qual a sua posição sobre a Classificação Indicativa? Acredita que a
mesma limita os intentos dos autores da mesma forma que a Censura
fazia nos anos 70/80?

Sou visceralmente contra qualquer tipo de censura. Os produtores e autores são pessoas responsáveis e sensatas. Temos discernimento do que se pode ou não expressar em função dos horários da grade de programação. Em caso de insatisfação a sociedade tem o caminho legal.

Naturalmente que uma Classificação Indicativa não tem o poder de destruição, veto e corte que a censura da ditadura exerceu durante anos, mas pode ser a semente para que, os guardiões da moral conservadora se arvorem a recriar o monstro que destruiu tantos trabalhos bons nos anos de chumbo.


Daniel Pepe pergunta:
8- Explicando para os nossos leitores, seu filho Ricardo faleceu prematuramente vítima da AIDS, depois de ter sido contaminado por uma seringa no hospital-dia que frequentava, onde ele fazia tratamento para os surtos que o afastavam temporariamente da realidade. O tema da AIDS foi abordado de passagem em "O Salvador da Pátria" e com mais profundidade em "Zazá". Como foi levar um acontecimento pessoal para a ficção? Você já criou algum personagem inspirado nos problemas psíquicos do Ricardo?

É muito difícil para mim criar qualquer personagem que tenha os problemas que levaram meu filho de mim. Convivi cinco anos com esse maldito vírus, maldita praga! Hoje, 19 anos depois, consigo falar sobre isso, mas na época da novela Zazá eu sentia necessidade de informar os telespectadores do perigo da contaminação. Então criei uma personagem feminina que fora infectada e tentei passar o máximo possível de informações ao grande público. A situação ficou meio postiça, a novela era uma comédia...


Guilherme Staush pergunta:
9- Sua novela “Os Gigantes”, de 1979, foi uma das poucas, senão a única a discutir “o homicídio piedoso”. Mais de 30 anos depois, o tema continua polêmico e raramente abordado na TV. Você não tem vontade de voltar a explorar o tema da eutanásia ou da ortotanásia em alguma novela sua? Ou essa temática teria te deixado traumatizado por todos os aborrecimentos que você teve ao contar a história de Paloma?

A novela Os Gigantes era muito mórbida. Já vi grandes obras sobre o tema, no teatro e no cinema (A Invasão dos Bárbaros). Os problemas maiores que tive na novela foram com o elenco e direção, saturados pela morbidez do tema.


Guilherme Staush pergunta:
10- Pra terminar, vou repetir uma pergunta que fiz a autora Cristianne Fridman, sua colega na Rede Record, na ocasião em que a entrevistamos aqui no blog.
Os grupos de discussão no Orkut são quase unânimes com relação a teledramaturgia da Rede Record. “Essas Mulheres” e “Cidadão Brasileiro” são apontadas como as melhores novelas da emissora, até então. Entretanto, a Record insiste em produzir novelas bem diferentes, com muita ação, violência, perseguição de carros, e todas elas com um número enorme de capítulos (“Ribeirão do Tempo” acabou com quase um ano no ar) tornando-as muito parecidas nesses aspectos. Como resultado, entra novela e sai novela, e a impressão que se tem é de que são todas as mesmas, só muda o título. Como você avalia isso?
Por que novelas de prestígio como as supracitadas não têm mais espaço na emissora?

Está claro para todos que a TV Record está direcionando sua base de comunicação a partir de temas de grande impacto policial. Basta analisar a opção clara do jornalismo da emissora: forte, investigativo e contundente. Por isso optei por fazer Poder Paralelo, uma novela bastante explosiva, de acordo com a linha da emissora. É preciso entender que a TV Record está numa fase de implantação da sua Rede. Não é fácil enfrentar a Rede Globo sem uma temática central de forte apelo popular. É uma opção e um caminho que está dando bons resultados, revelando as mazelas do submundo e a carência de socorro do poder público.
“Poder Paralelo” é uma novela que tratou de um tema bastante oportuno e atual no país: a máfia e o tráfico de drogas, a influência das organizações criminosas transnacionais e o poder paralelo gerado por essas gangues, que ensaiam sempre uma participação e influência no poder central da República. Foi importante falar das operações da Polícia Federal, no contato da máfia com as FARC e da intromissão de um poderoso organismo americano (DEA) no país.

"Navegantes" (título provisório), minha próxima novela, se passa em um cruzeiro marítimo. Estou trabalhando em um tema mais humanista, embora eu parta de um mistério (policial) para abrir a novela com forte impacto.

***




19 comentários:

Mauro Barcellos disse...

Lauro não se supera só em suas novelas, mas em entrevistas! Cada uma melhor do que a outra. E vcs do blog estão de parabéns! Entrevista maravilhosa!

Juliano G. Bonatto disse...

Mais uma vez as entrevistas do Agora arrebentando. Adoro o traabalho do Lauro! Nota-se que ele se engajou mesmo na entrevista. Bem diferente de alguns colegas dele que passaram aqui pelo blog..rs

Anônimo disse...

Lauro demonstrando toda sua inteligência e conhecimento sobre TV, e o Agora, mais uma vez, dando um show nas entrevistas! Parabéns!

Telinha VIP disse...

Lauro é um grande autor, figura inteligente, educado e sempre nos prestigia com grandes entrevistas. Já tive o prazer de entrevistá-lo uma vez.
Um grande mérito de vocês do blog, que sempre conseguem tirar ótimos relatos dos entrevistados. Coisa que muitos jornalistas profissionais não sabem fazer.

Parabéns a todos!

Licinha disse...

Maravilhosa entrevista!
Eu estranhei bastante essa última novela do Lauro. Foi a que menos me agradou. Foi bom porque ele mostrou que pode fazer uma novela diferente, sem ligar o piloto automático, como a maioria dos autores fazem atualmente. Mas prefiro bem mais as novelas ambientadas em cidades do interior com temática mais política, como O Salvador da Pátria ou Cidadão Brasileiro.

Parabéns aos meninos do blog.

Anônimo disse...

Adorei a entrevista. Uma pena não terem explorado mais sobre Navegantes, gostaria de saber mais sobre a trama. Se Paloma Duarte e Miriam Freeland serão mesmo as protagonistas, se é verdade que você deseja contar com Gabriel Braga Nunes, hoje na Globo como o grande galã da novela. Enfim, poderiam ter explorado mais isso.

Matusa Brasil disse...

Lauro é o melhor!
Faz novela de verdade.
Espero ansioso por Navegantes. rs
Parabéns pela excelente entrevista meninos.
Abraços e Sucesso

Lucas disse...

De fato um exelente autor deveria voltar para a globo pra que suas novelas enfim tenham sua repercursão merecida

Kleiton Alves Hermann disse...

Não sabia dessa história do Marcilio x Lauro ..Bafão!
E de uma coisa o Lauro tem razão, sobre Insensato Coração, a entrevista feita com Ricardo Linhares por vocês deixa claro quem realmente escreve a novela.
Ótima entrevista!

Anônimo disse...

Garotos, vcs se superaram nessa entrevista! Parabéns ao profissionalismo e à gentileza do entrevistado também!

Queria muito ver esse autor fazendo uma novela das 9h na globo. Era pequeno nos tempos de Roda de Fogo e Salvador da Pátria... Comecei a ver Cidadão Brasileiro, mas, com o passar do tempo, não aguentei a oscilação no horário nem a fraca produção.

Eduardo Vieira - Recife/PE

Mauro Barcellos disse...

Competência e cultura fazem do Lauro o grande autor que ele é. Roda de Fogo e O Salvador da Pátria são dois marcos na TV. As melhores novelas dos anos 80, juntamente com Vale Tudo e Roque Santeiro. Parabéns pela grande entrevista!

Kleiton Alves Hermann disse...

Realmente nunca se sabe quem escreve as novelas que vemos. Se duvidar, os colaboradores escrevem a maior parte, e os autores apenas supervisionam. Insensato tem bem mais a cara do Ricardo do que a do Gilberto. Mas Roda de Fogo tem bem o estilo do Lauro. Ninguém conhecia o Marcilio na época. Nem haveria como creditar a novela a ele, já que o autor ainda nao tinha identidade própria.
Grande entrevista!! (nos dois sentidos!)

André San disse...

"Dê qualidade ao público e ele reconhecerá". Disse tudo! Alguns ainda tem a mania de subestimar a audiência das novelas, como se fossem um bando de tolos que engole qualquer coisa. É por isso que Lauro é o que é! Sou fã do trabalho dele, suas duas novelas na Record figuram entre as melhores novelas da década de 2000, e sua campanha a favor da redução das novelas é bem oportuna. Também acho que a longa duração dos folhetins é extremamente prejudicial. Ótima entrevista, parabéns! Abraço!
André San - www.tele-visao.zip.net

Nilson Xavier disse...

Sou fã de Lauro e cada entrevista dele que leio é uma nova descoberta, é algo sempre a agregar.

Parabéns equipe!

Eddy Fernandes disse...

Também sou um grande admirador do Lauro.

É um bálsamo ler essa entrevista e sentir que o gênero novela não está totalmente perdido, que ainda tem gente disposta a mexer nas estruturas, a quebrar paradigmas.

Rapazes, vocês estão de parabéns!

Mauro Barcellos disse...

Gosto muito dos herois e dos vilões do Lauro, até mesmo Paloma, melancólica e cheia de contradições. Mas nada me fascimnou mais no universo do autor do que a trajetória de Antonio Maciel em Cidadão Brasileiro. Achei a novela um verdadeiro brilhante!
Lauro, por favor, não desista. Não se renda às exigências mercadológicas!

RÔ_drigo disse...

Grande entrevista meninos;]]
Laurão é fowda=D

Fernando Oliveira disse...

Na minha humilde opinião, uma novela para ser dinâmica não precisa ultrapassar os 200 capítulos, muito menos exagerar na violência. A Record está exagerando. Vidas Opostas, Ribeirão do Tempo, Vidas em Jogo, todas tiveram cena de um homem espancando uma mulher. Cenas de bang bang... Pra que isso? Basta o Record Notícias e o DaPena que só mostram tragédias. Mas voltando às novelas, o Lauro arrasou em Cidadão Brasileiro, e desta eu destaco o último capítulo que foi excelente. Parabéns ao blog pela ótima entrevista.

Juliano G. Bonatto disse...

O problema da Record é que as cenas de violência doméstica são sempre sensacionalistas, chamarisco para levantar a audiência. Nunca cumprem uma função social.